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A Burocracia Fiscal e a Classe Política Fisiológica

A convergência ocorre, então, com a junção do interesse fiscal dos burocratas dos órgãos centrais do governo com o interesse seletivo da classe política fisiológica.

Burocrata

Ouvi, certa vez, de uma estudiosa dos assuntos governamentais do Canadá, que as mudanças provocadas pelas eleições são imperceptíveis para a maior parte das políticas públicas do país.

O interesse público estava tão consolidado nos afazeres da burocracia que o ingresso de novas autoridades não afetava a entrega de produtos e serviços para a população.

Na França, um secretário-geral da administração ou, na boca de Weber, uma espécie de ‘chefe do estado maior administrativo’, tem a missão de fazer com que as coisas aconteçam enquanto se desenrolam as disputas políticas. Nas transições de governo, inclusive, é ele quem manda.

Origina-se desses exemplos, provavelmente, a expressão ‘máquina pública’. Nesses países, a burocracia produz como uma máquina produz.

Não é necessário andar muito pela Esplanada dos Ministérios para descobrir que esses exemplos pouco valem por aqui. O regime da máquina pública brasileira é o da improdutividade. Há várias categorias de justificação para esse fenômeno depreciativo. Elas já foram objeto de vários artigos neste blog. No artigo ora em desenvolvimento, a abordagem foca o interesse de agentes importantes e que disputam a ferro e fogo o domínio da alocação dos recursos financeiros públicos: os burocratas dos órgãos centrais, notadamente as carreiras que exercem suas atividades no Ministério da Fazenda e do Planejamento, e os representantes fisiológicos da classe política.

À primeira impressão, esses dois grupos têm interesses diversos. Os burocratas dos órgãos centrais patrocinando a estabilidade e os resultados das políticas públicas e os representantes fisiológicos da classe política objetivando, exclusivamente, interesses subalternos.

São, em verdade, interesses convergentes.

Para os burocratas dos órgãos centrais, estabilizar as políticas públicas fora do ciclo das eleições e entregar produtos e serviços, de forma regular, à população, exigem que o Estado assuma compromissos de longo prazo para o seu financiamento ou participe majoritariamente dele. Para eles, ou para nós, esse ônus é excessivo. As carências da sociedade e do território são tantas que não podem ser supridas sem sofrimento fiscal. Assim, pagar à classe política mais fisiológica é mais negócio, do ponto de vista fiscal, que estabilizar as políticas públicas. Compra-se governabilidade com os recursos que deveriam ser dirigidos a políticas públicas estáveis.

Olhando pelo outro lado, podemos identificar as convergências. A classe política fisiológica não quer estabilizar as políticas públicas nem naturalizar a entrega de produtos e serviços à sociedade.

Os produtos e serviços devem ser entregues à sociedade por meio de uma intermediação que envolve o Poder Executivo e ela, a classe política fisiológica. As entregas devem ser seletivas e beneficiar regiões e pessoas dos seus feudos particulares. Por ser seletiva e não abrangente, o ônus estatal é menor. Menos pessoas e regiões beneficiárias reduzem o ônus estatal.

A convergência ocorre, então, com a junção do interesse fiscal dos burocratas dos órgãos centrais com o interesse seletivo da classe política fisiológica.

Assim, a estabilidade das políticas públicas e a entrega de produtos e serviços para a sociedade, dinâmicas que levariam ao desenvolvimento nacional, restam derrotadas por dois interesses minúsculos.

Como romper com essas dinâmicas, que influenciam as decisões da espinha dorsal do governo, as burocracias dos órgãos centrais, e asseguram a governabilidade do Presidente, por meio da classe política fisiológica, é um dos maiores desafios da política e da administração pública nacional.

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