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O Medo Do Mercado e O Ministro Da Fazenda De Lula

O Ministério da Fazenda estava entre arroz e poupança, feijão e dívida pública, pão e gasto. Arroz, feijão e pão de um lado; poupança, dívida pública e gasto do outro.

- Por que eu?

Pergunta o ministro da Fazenda.

- Porque você está bem com o presidente e... quem projeta a arrecadação é você – confirma o ministro do Planejamento.

- Não, é uma visão conjunta. Eu vou de receita líquida, você com as despesas obrigatórias. A diferença é o que temos. Se vai faltar dinheiro para a meta do bolsa-família, o problema não é meu.

O ministro da Fazenda não poderia ter qualquer dúvida sobre o encanto que a unívoca marcha da estabilidade exercia sobre o presidente, mas quando o assunto era bolsa-família, desconfiava, Lula era mais marcha que estabilidade. Ele não iria só, só empurrado. A Fazenda era estrelada por um general vitorioso – imagem é tudo - e que sabia escolher batalhas. Além do mais, o mercado gosta de ministro da Fazenda autônomo em questões fiscais e, até aquele momento, ele era autônomo em questões fiscais. Não poderia aceitar passivamente uma despesa permanente no colo da economia. Aquelas três refeiçoezinhas diárias das quais tão bem falava Lula não causariam indigestão ao Brasil? Nasce um custeio novo, vira despesa obrigatória e, salvem o país!, é custo Brasil na veia. A Fazenda estava entre arroz e poupança, feijão e dívida pública, pão e gasto. Arroz, feijão e pão de um lado; poupança, dívida pública e gasto do outro.

- Custeio ou investimento, ministro. Temos que escolher. Serão 10 bi de reais a mais por ano – apareceu o secretário do Tesouro. Ponto quatro do PIB no custo Brasil.

- Pelo visto, vamos ter que empurrá-lo – voltou o ministro do Planejamento.

Convencido, o ministro da Fazenda começou a organizar o discurso. Já são seis milhões e meio de famílias. As contas públicas suportam mais um milhão em dois anos. A meta de onze milhões ficaria para o próximo mandato.

- Eu sou médico – reclamou novamente o ministro da Fazenda. Por que eu? É a hora de um ministro economista, tem muito número...

- Por que economista? – protestou um, economista. Esse assunto está ficando político e o melhor ...

- ... É um político.

Uma escada estreita, no córner nordeste do palácio, parte do quarto andar e permite o acesso da reunião ao gabinete presidencial, mas a verdadeira distância era outra:

- Desçam os dois juntos - alguém deu a idéia - e comuniquem a Lula uma mera questão aritmética: a receita bruta menos as transferências constitucionais para estados e municípios menos as despesas obrigatórias da União menos o superávit primário e menos mais alguma coisa ...

- Não há dúvida, pô: só cabe mais um milhão no bolsa-família.

Esperávamos algo mais daqueles generais, assustados com alguns degraus de escada, como se fosse a travessia sem volta das águas do Rubicão, que tanto prometeu a César e tanto assustou alguns senadores em Roma. Telefonaram – finalmente - e o gabinete presidencial os autorizou a descer.

Em menos de cinco minutos, já estavam de volta. Captei a situação ao ouvi-los ainda na escada, um reclamando da falta de educação do presidente e o outro da resposta que lhe faltara.

Pareciam esgotados. O secretário do Tesouro resolveu brincar:

- Estão precisando de exercício físico. Uma escadinha dessas ...

- Não, secretário, estamos precisando de argumento.

- Você usaram a ameaça do mercado?

- Usamos.

- E ...

- Ele não quer ministro com medo do mercado.

- Pelo menos podemos dar uma atrasadinha básica no cronograma?

- Não, ele pediu uma aceleradinha.

- Aceleradinha? Aceleradinha?

- É, e pediu uns cálculos, que ele quer dar um aumentozinho.

- Aumentozinho? Ele sabe quanto é o gasto?

- Esquece. Ele disse que o bolsa-família é um investimento e que nós já havíamos lhe dito ...

- O quê?

- Que investimento, pode.

 

A história envolveu o Simonsen e o Geisel, então presidente. Só vou contar para mostrar que o modelo é antigo, quer dizer, não ter modelo é antigo. Geisel queria porque queria fazer uma obra que, segundo quem me contou, não ficaria por menos de oitocentos milhões de dólares. Simonsen não titubeou:

- Não há dinheiro, presidente.

- Eu preciso dessa obra, Simonsen.

- Não temos como fazê-la.

- Você quer dizer, Simonsen, que se eu entrar em guerra contra a Argentina, não terei dinheiro para armar os soldados, produzir tanques e aviões, construir acessos terrestres, nada?

- Bem, nesse caso extremo, nós teríamos dinheiro, presidente.

- Pois bem, Simonsen, me arruma o dinheiro para a obra e eu prometo a você que não vou invadir a Argentina.

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