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Quem Vai Pagar a “Crise de Meia Idade” Da Previdência?

A emenda constitucional tem como regra geral adiar a aposentadoria do servidor público. Quando estiver chegando a sua hora, a idade mínima vai aumentar mais um pouco.

Este artigo é o quarto da série de análises sobre a Reforma da Previdência.

Idosas

Os japoneses e os chineses fazem oitenta anos de idade e resolvem que chegou a hora, finalmente, de conhecerem o mundo. Visitam todos os continentes, os países importantes, as cidades relevantes e ainda têm dinheiro e saúde para enfrentar mais viagem.

Os velhinhos europeus, consumindo suas geléias de mirtilo desde criança, são assíduos turistas em cidades cosmopolitas ou culturalmente relevantes espalhadas pelos cinco continentes.

Os anciãos da geração de Donald Trump partem dos Estados Unidos para conhecerem o mundo com as sacolas cheias de dólar.

Em geral, essa turma do primeiro mundo vive pra burro antes de se aposentar e mais um bocado depois que se aposenta. Tem a ver com a situação financeira do país e da família, educação, condições básicas de saúde, tratamento preventivo e curativo apropriados e, no caso dos povos mais antigos, principalmente os asiáticos, hábitos alimentares saudáveis. Há mais itens nessa lista, mas ela é, no entanto, exemplificativa, não exaustiva.

Nos países em desenvolvimento, ao se aposentarem, os velhinhos não têm dinheiro nem saúde para conhecerem o mundo. Muito pelo contrário, levam uma vida espartana próxima aos familiares, são depositados em asilos ou, na falta de uma transição suave, caminham direto para o cemitério.

Essa velhice tão diferente, país a país, é mais um contraponto presente na vasta literatura que estuda o distanciamento entre os cidadãos no mundo.

Vem daí que os argumentos que se seguiram à apresentação da Proposta de Emenda Constitucional de reforma da previdência comparando a idade mínima das aposentadorias dos brasileiros com as de outros países não seriam válidos já na partida. As condições de vida lá e cá são muito diferentes.

Mesmo assim, podemos dizer que não passamos vergonha no quesito idade mínima. Não somos ‘vagabundos’ – há exceções, lógico - se aposentando cedo. Hoje, o servidor público tem a idade mínima para a aposentadoria definida em 60 anos para homens e 55 para mulheres. O trabalhador sob o regime da CLT se aposenta aos 65 anos e a trabalhadora aos 60 - cruzando os dois regimes, a mulher celetista tem a mesma idade mínima para aposentadoria que o homem servidor público. Isso vem desde 1998. Não deixa de ser um modelo injusto.

Com o direito estabelecido de aposentadoria a partir de 55 anos ou 60 anos, os servidores públicos brasileiros estão se aposentando, na média, com 61 anos. Esta idade média de aposentadoria é a mesma do celetista. Mesmo com cinco anos de diferença na idade mínima entre os dois regimes, tanto para homens quanto para mulheres, as idades médias de aposentadoria se aproximam nos dois regimes porque o servidor público normalmente perde remuneração ao se aposentar – no mínimo, perde o abono de permanência, que é equivalente à sua contribuição ao regime próprio previdenciário -, preferindo adiá-la.

Entre 55 e 60 anos se aposentam os russos, os turcos e os indianos. Os chineses, os uruguaios, os coreanos do sul e os franceses se aposentam na faixa de 60 anos e não distinguem homens e mulheres. Italianos, ingleses, suíços se aposentam entre 60 e 65 anos, com diferenças de 01 a 02 anos entre homens e mulheres. Japoneses, suecos, alemães e canadenses levantaram o número para 65, homens ou mulheres.

Entre 55 e 65 anos se aposentam praticamente todos os trabalhadores do mundo, com raras exceções, e não é patriotada separar homens e mulheres. Ocorre aqui e ocorre ali. Diferenciar homens e mulheres pode não fazer sentido em alguns países desenvolvidos, mas a saga familiar das mulheres do terceiro mundo recomenda alguma diferenciação.

Em resumo, temos idade mínima e diferenciamos homens e mulheres, como o fazem vários países no planeta.

Fazendo o discurso de equilíbrio financeiro (nem se está discutindo o equilíbrio atuarial) do regime próprio dos servidores públicos, a emenda constitucional ataca a idade mínima, a contribuição, a remuneração, o reajuste, a pensão e outros institutos mais. Nenhum, dentre os relevantes, passou incólume pela proposta. A avaliação política atual é a de que a emenda não será aprovada no Congresso Nacional. Mas, de repente, muda o presidente e, informam-nos os analistas, ela volta a ter chance.

Pelo sim, pelo não, vamos entender a emenda. Primeiro, a questão da idade.

Os servidores que ingressarem no serviço público a partir da promulgação da emenda se aposentarão aos 65 anos os homens e 62 as mulheres. Em comparação, estaremos numa faixa de idade mínima e de diferenciação entre homens e mulheres equivalentes à Itália, Inglaterra e Suiça. O fato de alcançar apenas os novos servidores, ou seja, a regra estará prevista para quem quiser futuramente ingressar no serviço público, reduz a objeção à proposta.

É absolutamente dispensável, no entanto, os acréscimos na idade mínima toda vez que melhorar a expectativa de sobrevida da população brasileira aos 65 anos de idade, como proposto na emenda.

Nossa expectativa de vida hoje é 75,5 anos. Aposentando-se aos 65, o servidor teria 10,5 anos de sobrevida ou, em outros termos, de renda previdenciária sem trabalho (75,5 menos 65). Aumentando a sobrevida para 12,5 anos, como exemplo, a idade mínima automaticamente passaria para 67 anos. A idade mínima teria uma ignição automática na medida em que melhorassem as expectativas de vida. Sob outra leitura, ficaria eternamente congelado o tempo de 10,5 anos de renda previdenciária sem trabalho. Quando as condições do país permitissem uma sobrevida melhor, esse período seria dedicado ao trabalho, não ao descanso. Ficaria associada uma punição de um ano nos requisitos de idade mínima ao servidor público quando houvesse melhoria em um ano na expectativa de vida dos brasileiros.

Já criticamos aqui no blog o fato de a emenda atravessar a vida de quem já está no serviço público. Atualmente, o servidor aposenta com 60 anos e a servidora com 55, mas, na média, a aposentadoria ocorre aos 61. Pela emenda, a partir de 2019, a idade mínima anda mais um ano e a cada 02 anos, anda-se outro ano. De forma que, a partir de 2027, a idade mínima de quem já está no serviço público passa a equivaler àquela de quem ingressar no serviço público a partir da promulgação da emenda, ou seja, 65 anos para homem, 62 para mulheres. Uma equivalência com aparência de naturalidade, mas com alteração radical na regra do jogo.

Um último detalhe alcança aqueles servidores que estavam em exercício no serviço público quando da promulgação da Emenda Constitucional 19 (dezembro de 1998). As contas de idade mínima feitas na forma do parágrafo anterior serão reduzidas em um dia para cada dia de contribuição que ultrapassar 35 anos. Atualmente, reduz-se um ano para cada ano de contribuição e a proposta vem acelerar o direito desses servidores, em contramão ao objetivo geral da emenda. Só faria sentido essa proposta se fosse estendida a todos os servidores em exercício na data da promulgação da emenda.

Lógico que o instituto da idade mínima não funciona isoladamente. Dentro do sistema proposto, ele é um elemento apenas. Os atuais servidores serão sacrificados em remuneração e reajuste se acreditarem que vão se aposentar aos 60 ou 55 anos de idade. Explicaremos como ficarão os outros institutos nos próximos posts sobre o assunto.


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